.:: Alexis Mor' ::.
(Por Marcelo Copello /publicado na revista GOSTO número 4)


Minha relação com Frank Sinatra não poderia ser mais antiga. Segundo meus pais eu fui concebido ao som de Sinatra. Desde então não parei de ouvir a música deste esplêndido cantor, que foi a voz do século XX e, ao que parece, não será esquecido no novo milênio.

No final de agosto deste ano os jornais de todo o mundo anunciaram que a gravadora Universal Music adquiriu os direitos para relançar todo o catálogo do selo Reprise, criado por Sinatra em 1961. A compra prevê um extenso cronograma de reedições de CDs e DVDs, incluindo material inédito. O pontapé inicial vai ser dado este mês (outubro) com a edição comemorativa dos 40 anos do álbum My Way, lançado em 1969.

O que poucos lembram é que “The Voice” é um dos únicos cantores (junto com Billie Holiday) cuja voz tem diferentes “safras”. Seu timbre mudou drasticamente ao longo de sua carreira, com diferentes arranjadores, em diferentes gravadoras. Pode-se, por exemplo, pedir um “Sinatra da Columbia”, ou um “Sinatra da Capitol” como quem pede um “Borgonha 1996”, ou um “Porto Vintage 1994”. Em sua primeira fase, nos anos 1940, “a voz” soava aveludada, limpa, com ampla extensão de graves e agudos.

Dizem que videiras precisam sofrer (estresse hídrico) para dar bons vinhos. Foi assim com Sinatra. É consenso entre críticos que só depois das dores do casamento com Ava Garner e da aparente perda da voz em 1950 Sinatra atingiu sua maturidade como intérprete. Seu timbre mudou, por um lado deixou de ser tão limpo e macio, por outro ficou mais encorpado, ganhou peso, profundidade dramática e um toque metálico que os músicos chama de punch. A partir daí podemos dizer que sua voz evoluiu linerarmente, dos anos 1960 até suas últimas gravações nos anos 1990. Aos poucos perdeu agudos, perpsistencia nas notas longas, limpeza e brilho, mas ganhou graves e certa aspereza que enfatiza ainda mais a densidade dramátrica de suas interpretações.

Esta evolução da “voz” é semelhante à evolução de um vinho de guarda. A metáfora perfeita é encontrada nos vinhos clássicos espanhóis, como os da Rioja. Sua primeira fase equivale a um vinho “Cosecha”, leve, fresco, sem madeira, sedutor. A segunda, na gravadora Capitol, já ganha amadurecimento em madeira, com certa aspereza de taninos e alguma complexidade, como um “Crianza”. As fases seguintes aprofundam a aspereza da madeira, perdendo frescor, mas ganhando enorme complexidade e profundidade. Podemos perfeitamente comparar a voz de Sinatra nos anos 1960 e 1970 a um “Reserva”, e seu timbre maduro dos anos 1980 e 1990, com um “Gran Reserva” em sua plenitude.

Ouça um “Gran Reserva” na gravação de “One for My baby” no disco “Duets” de 1993. Sinatra, aos 77 anos, já sem o vozeirão mas com grande emoção, nos encanta em uma de suas canções prediletas. Para acompanhar sugiro: Castillo Ygay Gran Reserva Especial 1998, Marques de Murrieta, Rioja-Espanha, amadurecido 41 meses em barricas. Aromas muito ricos e finos, onde a madeira dá o tom, amalgamada com ameixas, cerejas, frutas secas, especiarias, tostados, coco queimado, baunilha, caramelo, tabaco. Paladar profundo, com taninos doces, longo. 93 pontos



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